BOAI-10: sobre promoção e coordenação
Dando continuidade à série de posts decorrentes das recomendações formuladas pelo BOAI-10, segue a matéria abaixo, que trata da promoção e coordenação:
4.1. Devemos fazer mais para consciencializar os editores de revistas, os editores científicos, revisores e pesquisadores dos padrões de conduta profissional para publicação em OA, por exemplo, quanto ao licenciamento, processo editorial, apelo à submissão de artigos em OA, identificação de propriedade e gestão de taxas de publicação. Os editores científicos, revisores e pesquisadores devem avaliar as oportunidades de envolvimento com editores de revistas na base destes padrões de conduta profissional. Quando os editores não agirem de acordo com esses padrões devemos ajudá-los a melhorar, como um primeiro passo.
- Como forma de avaliar um editor ou revistas OA, novas ou desconhecidas, recomendamos que os pesquisadores consultem a associação de editores de acesso aberto (OASPA – Open Access Scholarly Publishers Association) e o seu código de conduta. Queixas sobre editores membros da OASPA ou sugestões de melhoria do código de conduta devem ser enviados para a OASPA.
- Encorajamos todos os editores OA e as revistas OA a aplicar as boas práticas recomendadas pela OASPA ou a procurar tornar-se membro da associação, o que implicará uma análise das suas práticas e oferecerá uma oportunidade para corrigí-las se necessário.
4.2. Devemos desenvolver diretrizes para universidades e agências de financiamento que estejam considerando a definição de políticas de OA, incluindo os termos recomendados para as políticas, boas práticas e respostas a perguntas a questões frequentes.
4.3. Encorajamos o desenvolvimento de recursos consolidados que facilitem o acompanhamento do progresso do OA por meio dos números e gráficos mais relevantes. Cada unidade de informação deve ser atualizada regularmente e a sua proveniência ou método de cálculo claramente indicada.
4.4. A comunidade OA deve agir mais frequentemente de modo conjunto. Sempre que possível, as organizações e ativistas OA devem procurar formas de coordenar as suas atividades e comunicações no sentido de utilizar melhor os seus recursos, minimizar a duplicação de esforços, reforçar a mensagem e demonstrar coesão.
- Devemos criar melhores mecanismos para comunicarmos e coordenarmos uns com os outros.
- Devemos comunicar com os nossos colegas acadêmicos, a imprensa acadêmica e imprensa não acadêmica mainstream. A mídia acadêmica e não-acadêmica estão mais informadas e mais interessadas em OA do que nunca. Isto é uma oportunidade para ajudar a educar todas as partes interessadas acerca do OA e das novas propostas para o desenvolvimento do OA.
4.5. A campanha mundial pelo OA aos artigos científicos deve trabalhar em maior proximidade com a campanha mundial pelo OA aos livros, teses e dissertações, dados científicos, dados governamentais, recursos educativos e código-fonte.
- Devemos coordenar com esforços afins menos diretamente relacionados com o acesso aos resultados da pesquisa, como a reforma dos direitos de autor, obras órfãs, preservação digital, digitalização de literatura impressa, decisão política baseada em evidências, a liberdade de expressão e a evolução de bibliotecas, publicação, revisão por pares e medias sociais.
- Devemos procurar formas de amplificar as nossas diferentes vozes quando defendemos princípios comuns.
4.6. Precisamos afirmar mais claramente, com mais evidências e a mais grupos de interessados, as seguintes verdades sobre o OA:
- O OA beneficia a pesquisa e os pesquisadores, e sua falta os prejudica.
- O OA à pesquisa financiada com recursos públicos beneficia os contribuintes e aumenta o retorno do seu investimento na pesquisa. Existem benefícios econômicos bem como benefícios acadêmicos e científicos.
- O OA amplifica o valor social da pesquisa, e as políticas OA amplificam o valor social das agências de fomento e das instituições de pesquisa.
- Os custos do OA podem ser suportados sem adicionar mais dinheiro ao atual sistema de comunicação científica.
- O OA é consistente com as leis de direitos de autor em qualquer parte do mundo, e concede tanto aos autores quanto aos leitores mais diretos do que eles teriam no âmbito dos acordos de publicação convencionais.
- O OA é consistente com os mais elevados padrões de qualidade.
BOAI: uma década depois
Mera coincidência, ao publicar um post para relembrar os princípios da declaração BOAI tentei levar ao conhecimento da comunidade dos princípios e compromissos. Por outro lado, fui surpreendido pelas entrevistas em comemoração aos dez anos do BOAI publicadas por Stevan em seu blog Open Access Archivangelism. Na realidade são várias entrevistas. Assistam!
Stevan Harnad from Leslie Chan on Vimeo.
Acesso Livre: como tudo começou
Tenho percebido a existência de dúvidas no entendimento relacionado aos objetivos do Acesso Livre (Open Access – OA) e de suas estratégias. O contexto que fez com que o Acesso Livre (OA) efetivamente tomasse forma iniciou-se na última década do século XIX (anos 90), época em que a crise dos periódicos científicos se evidenciou pela alta excessiva dos preços das assinaturas e que provocou o cancelamento de muitos periódicos por parte de bibliotecas universitárias de várias parte do mundo e, consequentemente, estas começaram a rever as suas políticas de aquisição e muitos pesquisadores deixaram de ter acesso aos periódicos mais importantes para as suas pesquisas. Ao longo deste período diversas iniciativas alternativas foram desenvolvidas, como por exemplo, os arquivos abertos eletrônicos, desenvolvidos por Paul Ginsparg e seus colegas, dos quais se destacou o ArXiv. Foi um período difícil para os pesquisadores, mas interessante porque estes e conscientizaram do seu papel e também do fato de que seria necessário a busca de uma solução para disseminar livremente as suas descobertas científicas.Stevan Harnad explica sobre quais os reais interesses dos pesquisadores ao publicarem os seus achados ou descobertas científicas:
Ao contrário de outros tipos de autores, que publicam seus textos em busca da obtenção de lucros, os pesquisadores publicam suas descobertas para que possam ser utilizadas, aplicadas e dar origem a outras pesquisas a serem desenvolvidas por outros pesquisadores. A carreira do pesquisador e o progresso da ciência dependem da assimilação da pesquisa e do seu impacto. Os pesquisadores concordam em ceder gratuitamente os seus artigos às revistas científicas em troca de tê-los revisado por pares e certificados em conformidade com os padrões de qualidade das revistas em que elas são publicadas.
Paul Ginsparg vai mais longe ainda dizendo:
Então o ponto essencial é auto-evidente: se nós os pesquisadores não escrevemos com a expectativa de obter lucros diretamente de nossos esforços, então não há razão terrena que justifique que alguém deva obter lucros neste processo (exceto por um justo retorno sobre algum serviço com valor agregado não trivial que ele possa fornecer; ou exceto se, como era antigamente, no caso, apenas, da era da revista impressa, onde os verdadeiros custos para torná-los publicamente disponíveis eram suficientemente altos, de forma a exigir que eles fossem vendidos por um preço.)
A partir desta percepção surgiu o movimento Open Access cuja primeira declaração foi elaborada e lançada como resultado de uma reunião realizada nos dias 1 e 2 de dezembros de 2001, organizada pela Open Society Institute (OSI), o Budapest Open Access Iniciative (BOAI). Conforme descreve o seu sítio (http://www.soros.org/openaccess), esta declaração surge de uma pequena reunião, porém animada e que reuniu participantes de diversas disciplinas acadêmicas e de diversos países, cujo objetivo principal era acelerar o progresso no esforço internacional de tornar os artigos de pesquisa de toda as áreas acadêmicas disponíveis gratuitamente na Internet. Os participantes representavam muitos pontos de vistas e experiências de diversas iniciativas em curso que visavam o Acesso Livre. Foram exploradas como as iniciativas separadas atuando juntas poderiam alcançar o sucesso mais amplo, mais profundo e mais rápido. Eles exploraram as estratégias mais eficazes e acessíveis para servir aos interesses da pesquisa científica, dos pesquisadores e às instituições e sociedades que apoiam a pesquisa científica. Finalmente, eles exploraram como OSI e outras fundações poderiam usar seus recursos de maneira mais produtiva para ajudar a transição para a abertura do acesso à produção científica global, tornando as publicações periódicas científicas livremente acessível e economicamente autosustentável. O resultado é a Budapest Open Access Initiative, que é ao mesmo tempo uma declaração de princípios, uma declaração de estratégias e uma declaração de compromissos.
A declaração Budapest Open Access Initiative recomenda duas estratégias complementares:
i. Auto-arquivamento; e
ii. Revistas Científicas de Acesso Livre.
A primeira estratégia considera que os pesquisadores/acadêmicos precisam de ferramentas e assistência para depositar os seus artigos publicados em revistas arbitradas por revisão de pares (peer-review) em arquivos eletrônicos abertos, prática também chamada de auto arquivamento. Considerando que esses arquivos estejam em conformidade com as normas criadas pelo Open Archives Initiative (OAI), em seguida, os motores de busca e outras ferramentas podem tratá-los separadamente como sendo um só. Desta forma, os usuários, não precisarão saber quais arquivos existem ou onde eles se localizam, a fim de encontrar e fazer uso de seu conteúdo.
A segunda estratégia, Revistas Científicas de Acesso Livre, sugere que os pesquisadores/acadêmicos necessitam de meios para o lançamento de uma nova geração de revistas científicas comprometidas com o Acesso Livre, e ajudar as revistas existentes que se interessem em tornar-se de o Acesso Livre. Considerando que os artigos publicados nessas revistas devem ser disseminados o mais amplamente possível, estas novas revistas não demorarão a invocar os direitos autorais para restringir o seu acesso e uso. Ao invés disto, essas revistas usarão os direitos de autor e outros mecanismos para garantir o o seu permanente Acesso Livre. Considerando que o preço é uma barreira ao acesso, essas novas revistas não aumentarão os preços de assinatura ou taxas de acesso, e buscarão outros métodos para cobrir as suas despesas. Existem diversas alternativas de fontes de financiamento para tender a esses propósitos, incluindo as fundações e agências de fomento à pesquisa, as universidades e laboratórios que empregam pesquisadores, doações de instalação feitas por disciplinas ou instituições, amigos da causa do Acesso Livre, lucros da venda de complementos aos textos básicos, fundos liberados pelo desaparecimento ou cancelamento das tradicionais assinaturas de revistas ou taxas de acesso, ou mesmo contribuições dos próprios pesquisadores. Não há necessidade de favorecer uma solução em detrimento de outras para todas as disciplinas ou nações, e não há necessidade de parar de usar outras soluções criativas alternativas.
Esta declaração define os princípios e estratégias que têm sido seguidas e preconizadas por diversos líderes e especialistas. Paul Ginspag deu tom moral/ético, o fato de os pesquisadores não publicarem com interesses comerciais/lucrativos não dá direito a que outrem utilizar as suas descobertas para fazer lucro ou comércio. Conforme a declaração de Budapeste (BOAI) existem diversas fontes de recursos que poderão apoiar o lançamento/manutenção de uma Revista Científica de Acesso Livre. O uso consciente, moral e ético desses recursos depende dos editores das revistas. Trata-se de um procedimento como qualquer procedimento dentro da administração. Um procedimento incorreto ou fora da normalidade administrativa não pode ser imputado ao movimento do Acesso Livre.